Samantha Moreira
O que o transporte pode fazer pela leitura? E a leitura pelo transporte? Em Campinas, as duas respostas foram dadas com a implantação do projeto Leitura, a melhor viagem, lançado em setembro deste ano.
O projeto incentiva o hábito da leitura entre os usuários do transporte urbano e permite, ao mesmo tempo, que os usuários possam ter deslocamentos mais agradáveis, viajando pelo mundo do conhecimento.
O livre acesso à leitura acontece em nove terminais urbanos e na nova rodoviária. O usuário pode passar em uma das estantes instaladas e retirar o livro que desejar, sem nenhuma burocracia. Não há inscrição, carteirinhas, qualquer anotação do empréstimo ou data de entrega. O usuário pode até levar o livro para casa e devolvê-lo depois. Basta que ele retire e recoloque o livro em uma das estantes para que todos possam usufruir das descobertas e conhecimentos.
Para a construção do acervo, o primeiro passo foi incentivar as doações entre funcionários da própria Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec) e munícipes. O primeiro lote disponível aos usuários foi de 2,5 mil títulos. A partir daí, o processo de doação passou a ser permanente pela comunidade. Foram recebidas doações de empresas, livrarias e editoras, além da comunidade nos próprios terminais. No mês de novembro, o projeto completou dois meses e já somava cerca de 12,5 mil títulos para o empréstimo gratuito. É por isso que defendemos, de forma veemente, que aqueles que não acreditam no projeto façam visitações à Emdec para verificar que as doações não param. E, enquanto houver um livro doado, os pessimistas que nos perdoem, mas a resposta às doações comprova que uma parte importante do projeto vem sendo cumprida: a disponibilização permanente do acervo está garantida.
Reconhecemos que há uma questão crucial a ser vencida: a devolução dos livros. Há quem questione que a Emdec fez uma aposta às escuras ao ousar em “confiar” que os usuários atenderiam ao apelo da devolução para garantir a rotatividade dos títulos.
Também não nos constrange afirmar que boa parte do acervo, o que ainda não é possível estimar, deve seguir um caminho sem volta — fato que não nos amedronta. Afinal, os livros foram doados, muitos deles estavam deixados ou esquecidos e agora cumprem a sua finalidade: a de serem lidos.
Vale destacar ainda que o projeto aposta na implantação de uma cultura pautada no compromisso do leitor para garantir a rotatividade dos títulos, que deve ser construída cotidianamente. Ações semelhantes podem ser comparadas com nossa proposta e muitas delas foram desafios vitoriosos, somente a médio e longo prazos. Quem apostaria há poucos anos em práticas sustentáveis? Por que não acreditar que a população possa se comprometer com aquilo que lhe traz resultados e benefícios? Essa é a nossa aposta.
É claro que devemos fazer a nossa parte nessa construção. E o projeto já pensou nisto. Cada livro traz consigo mensagens que apelam para a devolução. Outras práticas, como ações de esvaziar por algum tempo as estantes nos terminais para chamar a atenção dos usuários para o retorno dos livros, também já foram adotadas e novas serão idealizadas.
Independente de se constituir numa esfera institucional no campo da Educação, a Emdec descobriu que muito além de proporcionar viagens mais agradáveis, pode contribuir ainda com a meta governamental de aumentar o nível de leitura no País em pelo menos 50% — para que o baixíssimo índice nacional de 1,8 alcance 2,7 livros por habitante/ano. O País inteiro deveria se mobilizar para vencer esse desafio.
Precisamos que os homens voltem a acreditar nos homens e se os livros, pela sua multiplicidade de funções, ainda puderem contribuir para isso, como no projeto Leitura, a melhor viagem, estaremos construindo um novo tempo e um País melhor.
Samantha Moreira, artista plástica, é gerente de Desenvolvimento e Educação da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas - Emdec.
Fonte: Correio Popular
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