O incentivo à leitura no Brasil vem recebendo cada vez mais atenção do governo, de empresas e de instituições que acreditam na construção de um país mais desenvolvido por meio do hábito da leitura. Porém, o quadro de brasileiros que leem com frequência não é muito animador, principalmente entre pessoas com mais de 60 anos, que, apesar de estarem com a vida mais tranquila, em sua grande maioria, não ocupam o tempo livre com a leitura.
De acordo com a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro, a maior parcela de não-leitores está entre os adultos de 30 a 39 anos, somando 15% dos entrevistados. De 40 a 49, também 15%; 50 a 59, 13%, e 60 a 69, 11%. Esse número diminui de acordo com a renda familiar e classe social, o que reforça que o poder aquisitivo é significativo para a constituição de leitores assíduos.
A pesquisa foi realizada com 92% da população, a partir dos 5 anos de idade. Desse número, apenas 3% de leitores têm mais de 60 anos, e a maioria da população leitora do país é de mulheres: 55%. A dona de casa Reni de Souza Cardoso faz parte dessas estatísticas. Aos 64 anos, ela afirma que não tem muita paciência para a leitura. “Eu recebo revistas na minha casa, abro dou uma lidinha e já perco a paciência, então deixo para lá”, explica. Apesar de saber a importância da leitura, Reni atribui a falta de interesse ao dia tumultuado e aos afazeres domésticos. “Não leio por falta de tempo, mesmo porque livro tem bastante aqui. Eu faço o serviço de casa, lavo e passo, cuido dos netos. Como a gente levanta bem de manhã e trabalha o dia todo, à noite não tem ânimo de ler, deita no sofá e já cochila”, diz.
Já para Geni Cerviglieri Valêncio, de 65 anos, ler não é uma das atividades preferidas. “Leio só meus livros de igreja. Quando vou na ‘Via Sacra’, ajudo na leitura, mas ler outras coisas é bem raro. No meu tempo livre, prefiro assistir minha novela, ou ir para casa das minhas filhas. Quando a idade vai chegando, a gente vai ficando sem paciência, sem concentração. Quando a gente envelhece tudo muda”, afirma.
Mudando a história - Foi pela da vontade de levar o prazer da leitura até a terceira idade que surgiu o projeto Leitura na Melhor Idade, com objetivo de desenvolver e exercitar a mente, viajar, sonhar e até mesmo relembrar a infância e a juventude por meio das palavras. “Lemos para eles poesias, contos, provérbios, parábolas, trechos bíblicos, letras de músicas, que até cantamos juntos. Intercalamos diversos tipos de leitura e usamos várias metodologias, inclusive as mesmas que utilizamos com crianças, e conseguimos atingir os mesmos resultados através de risos e alegria demonstrada por eles”, conta a professora Maria Edilma Travensoli Silveira, fundadora do projeto.
Este projeto vem sendo desenvolvido desde março de 2006 no Lar das Vovozinhas Balbina Branco, em Ponta Grossa, no Paraná. A entidade abriga 52 idosas e um idoso com mais de 50 anos, entre eles alguns com dificuldades auditivas, visuais e de locomoção. Segundo Maria Edilma, com o decorrer do tempo pode-se notar o desenvolvimento mental através da participação em interpretação e entendimento da leitura ouvida pelos idosos, que, no início, eram apáticos e quase nunca correspondiam às expectativas. “Atualmente sentimos uma participação de pelos menos 80% dos presentes nos debates feitos. Conseguem se concentrar e ouvir atentamente as leituras e entender, até mesmo interpretar, exemplificar e fazer relações com suas experiências de vida”, relata.
O sentimento, de acordo com a professora, é de muita gratificação. “Sentimos que este trabalho tem sido muito importante para estes idosos, porque eles estão exercitando a mente de maneira prazerosa. Essa atividade permite que eles saiam da monotonia e assim ocupem o tempo de maneira agradável.
Outro projeto que vem ajudando a difundir a leitura entre a terceira idade é o Leitura não tem Idade, idealizado pelo escritor Laé de Souza, aplicado em parceria com grupos de terceira idade. De acordo com o escritor, os grupos informam o número de participantes e então é enviado um exemplar da obra Nos Bastidores do Cotidiano, de Laé de Souza, e um questionário para cada participante. Quem responde recebe outra obra. O projeto é gratuito, não tem patrocínio e é destinado a grupos de terceira idade de todo o país.
“Em 2008 participaram 37 grupos. A resposta tem sido excelente e temos recebido manifestação dos participantes sobre a satisfação de ter participado do projeto”, comemora. Um dos grupos que fazem parte do projeto de Laé de Souza desde 2008 fica em Jaguariúna-SP. Os alunos integram o projeto Bem Me Quer, da Faculdade de Jaguariúna, onde é desenvolvido o projeto, juntamente com aulas de informática, de idiomas, dança e outras atividades.
Segundo a bibliotecária Maria Regina Trevisan Bacarelli, responsável pelo projeto, o principal objetivo desse trabalho é desenvolver as habilidades por meio da leitura de livros específicos e de entretenimento e desenvolver a oratória, além do enriquecimento intelectual. “Esperamos que através da leitura possamos proporcionar aos participantes o resgate de suas próprias experiências e necessidades. Uma terapia ocupacional através da leitura”, diz.
Gláucio Jair Russo, de 62 anos, que participa ativamente do projeto, elogia. “Os organizadores foram geniais em apresentar um projeto inédito em nossa cidade e principalmente em nossa faculdade. Com isso, poderemos apreciar a leitura de mais livros, já que hoje a terceira idade não tem acesso com muita facilidade. O livro fornecido pelo projeto do autor Laé de Souza foi o primeiro que eu tive o prazer de ler e gostaria de receber mais alguns”, solicita. Benedito Oscar Medeia, de 72 anos, também está satisfeito com os rumos do projeto. “Se os brasileiros se dedicassem mais à leitura, principalmente os jovens, não teríamos tantas desventuras”, afirma.
Fonte: Diário da Manhã
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