quarta-feira, 19 de maio de 2010

Projeto Farmácia das Letras leva livros às casas das pessoas

De porta em porta, Rosângela Tavares Santos Pereira, 39 anos, distribui conhecimento. Na maleta do Centro de Saúde 1 do Recanto das Emas, há remédios, aparelho para medir a pressão dos pacientes e livros, muitos livros. A agente entrega aos moradores de nove quadras da cidade muito mais do que medicamentos e medidas preventivas para manter um corpo são. Leva conforto para a alma e histórias que desenvolvem a imaginação e a criatividade de crianças, adolescentes e idosos saudáveis ou doentes.

A rotina de Rosângela Tavares começa logo cedo. Às 7h30, a agente de saúde já sabe quais quadras vai percorrer. O itinerário – que pode ser da 305 à 310 ou da 508 à 510 do Recanto – é definido dias antes. Todas as 230 famílias recebem o mesmo carinho e atenção. Na mala, Rosângela separa os livros de acordo com o perfil de cada leitor a ser visitado. Isso porque, há dois anos, trabalha com o projeto Farmácia das Letras, criado por ela e adotado por toda a equipe do Centro de Saúde 1 da cidade.

Às 8h, a turma começa a jornada de trabalho. Bate numa porta aqui e noutra acolá. Entra, aplica todo o processo de prevenção às doenças e, depois, em uma conversa tranquila e amigável, tenta aconselhar o paciente sobre a importância da leitura. Abre a maleta, mostra os exemplares reservados e convence o morador a experimentar folheá-los por, pelo menos, dez dias, até que a agente responsável retorne para outra visita preventiva. “A leitura estimula a memória, cria perspectiva nas pessoas e as tira da depressão e da ociosidade”, defende a criadora do projeto.

As visitas ocorrem de segunda a sexta-feira e, independentemente da distância, são feitas a pé. Os moradores já se acostumaram com os agentes. As pessoas os recebem, oferecem lanches, conversam e contam histórias. “Uma mulher estava sendo alfabetizada e pegou seu primeiro livro. Depois que aprendeu a ler, nunca mais parou e me pedia para levar receitas. Ela se interessou por culinária”, detalha Rosângela. Na prateleira, que fica na casa dela, mais de 580 exemplares. Revistas infantis, livros de autoajuda, poemas, obras didáticas e romances. “Ah, os romances! As mulheres se apaixonam por eles. Acho que são como refúgios para pessoas sofridas de uma comunidade carente. Elas começam a ver que existem maneiras diferentes de enxergar a vida e de serem tratadas”, conta.

Paixão por ler

O amor de Rosângela pela leitura teve início na infância. “Fui criada com minha avó e, certo dia, minha tia começou a fazer faxina nos armários da casa. Na bagunça, um livro velho caiu e eu peguei. Era Iracema. Li uma página, dias depois, outra e mais outra e, quando dei por mim, já havia terminado de ler”, lembra. Da paixão, Rosângela começou a colocar no papel as ideias que borbulhavam em sua cabeça. Escreveu vários poemas e os publicou em duas coletâneas: Manos da quebrada e Anjos da marquise. Depois, a escritora resolveu investir nos estudos. Começou o curso de letras, mas a dificuldade financeira prorrogou a vontade de ser professora e levar mais educação às pessoas.

Hoje, a moradora da Quadra 508 do Recanto das Emas ajuda como pode os amigos e vizinhos de bairro. “Como as crianças são mais difíceis de se conscientizar, fazemos passeios culturais à Feira do Livro e, assim, incentivamos a leitura”, conta. Os amigos Tiago Barbosa Sousa Santos, 11, e Ruan de Sousa, 12, já participaram do evento. “Passamos o dia na feira e lemos muitos livros”, contam. Larisse da Paixão, 11, lembra até o nome da obra que leu: Quem tem medo de quê, de Ruth Rocha. “Ele ensinava que podemos compartilhar nossos medos”, destaca. “Quem lê tem imaginação solta, criatividade e conhece o mundo”, defende Rosângela Tavares.

RIMA COM HUMOR
O livro Quem tem medo de quê?, de Ruth Rocha, tem 24 páginas de rima que dialogam de forma
bem-humorada com as ilustrações de Mariana Massarani. É uma leitura que abre as portas para que os medos, de forma natural, lúdica, sejam revelados.

VIRGEM TABAJARA
Em Iracema, de José de Alencar, a índia virgem tabajara consagrada a Tupã apaixona-se por Martim, guerreiro branco que personifica o inimigo. Por esse amor ela abandona sua tribo, tornando-se esposa dele.



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