Gabriel Perissé*
Tempo de ler é tempo de eternidade.
Tempo de ler é tempo de eternidade.
Ao ler um livro, transcendemos calendário e relógio.
Ao ler um grande autor, vencemos a miopia de só querer fazer coisas imediatamente úteis. Toda leitura é culturalmente sagrada, na medida em que cultiva o pleno desenvolvimento de uma pessoa.
Toda leitura é vencer a indiferença espiritual, o medo que temos da nossa alma. Toda leitura é sagrada, na medida em que nos abre os olhos para o divino-humano. Como ficar alheio à escatologia depois de ler a Divina Comédia? Como debochar da teologia depois de ler O idiota, de Dostoievsky? Como banalizar os conflitos da consciência religiosa depois de ler um Bernanos, um Murilo Mendes, uma Adélia Prado?
Toda leitura é sagrada, na medida em que nos faz perder o preconceito com relação às questões transcendentais. É possível cultivar esse preconceito depois de sentir a angústia de um Graciliano Ramos ou de um Kafka? Se não houvesse no ser humano uma insatisfação profunda com a sua atual condição, poderíamos passar os dias ganindo, devorando os inimigos, lutando pela sobrevivência, mas nunca escrevendo... O nosso passado cultural e literário está impregnado de reflexão teológica, explícita ou implicitamente. Dar as costas a essa realidade é dar as costas a nós mesmos!
Até os agnósticos e os ateus sabem que o humanismo está impregnado de caráter religioso.
Toda leitura humanizante pode tornar-se uma leitura santificante. E toda leitura é humanamente sagrada, e divinamente humana.
Ler é romper a monotonia, e isto é um ato sagrado.
Ler é lutar contra a violência destruidora do tempo, e isto é um ato sagrado.
Ler é beber da fonte da eterna inquietude, e isso é um ato sagrado.
Ler é suscitar o silêncio interior, caminho de amor e serenidade, e isto é um ato sagrado.
Ler é fazer uma homenagem à inteligência humana, e isto é um ato sagrado.
Ler é procurar, compreender, descobrir, e todos estes são atos sagrados.
A noção de civilização e a idéia que temos da humanidade são inseparáveis do nascimento do livro, da sua multiplicação como pão que nos salva da pior fome.
Não me refiro ao livro reduzido ao livro "prático", aos dicionários, aos manuais.
Refiro-me a todo livro que seja espelho no qual nos vemos, e janela através da qual vislumbramos o Outro.
Publicado em Julho/Agosto de 2010
*Gabriel Perissé é escritor, professor e
Conselheiro Cultural do Viva.http://www.perisse.com.br/
Fonte: Historiar
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