30/09/2010
Lucila Pastorello**
Vivemos em uma sociedade letrada, em que o domínio da leitura e da escrita não é uma habilidade apenas desejável, mas fundamental para o gozo da cidadania plena. Poderíamos continuar nossa conversa argumentando sobre a importância de saber ler e escrever, comentando a triste realidade nacional no que diz respeito aos índices de alfabetismo funcional, apontando os tropeços das políticas públicas na educação. Mas tais fatos são expostos contínua e exaustivamente nas mídias; não há nada de novo, apesar das condições alarmantes em que nos encontramos atualmente. Prefiro tratar de algumas ideias que, embora não sejam novas, parecem estar adormecidas em nossas discussões sobre leitura, e me parecem fundamentais para que possamos modificar nossa realidade e formar leitores críticos e competentes.
A primeira lembrança: o acesso à leitura começa antes do ingresso da criança na escolarização formal. A escola é atualmente a instituição responsável pela alfabetização e pela apropriação das práticas de lecto-escritura pelas crianças. Mas isso não significa que esta instituição seja a única responsável. As letras estão em toda parte. Começamos a aprender sobre a leitura bem antes de entrarmos na escola e continuamos este aprendizado por toda vida. Mas tomemos cuidado: aprender a ler não é o mesmo que alfabetizar-se.
A alfabetização é uma técnica que permite o deciframento do código escrito. Em nossa escrita alfabética existem relações muito específicas entre os sons da língua e a forma que estruturamos as letras graficamente. A leitura pressupõe naturalmente a alfabetização, mas vai muito, mas muito mais além. Trata-se de uma prática discursiva, o que quer dizer que ler é construir um sentido e não adivinhar o que está escrito. Mais recentemente utiliza-se o termo letramento para dar conta da dimensão discursiva, social e funcional da leitura.
Um bom leitor não é aquele que “entende” o que está escrito, mas é capaz de interpretar a escrita, percebendo as possibilidades de significação do escrito e conduzindo a construção do sentido a partir da articulação do texto às condições em que ele é produzido. Quem escreve, em que condições sócio-históricas, para quem, com quais objetivos, em que gênero discursivo são aspectos importantes para que a leitura possa ser experimentada em toda sua complexidade: não apenas transmitir informações, mas cumprir sua função cultural, social, expressiva e transformadora.
Portanto, aprender a ler é apropriar-se de uma prática cultural. Ler não é um dom natural. Precisamos que outra(s) pessoas(s) nos iniciem na leitura. Na escola? Aos seis ou sete anos? Absolutamente não! Mesmo habilidades naturais, as quais são mais associadas ao desenvolvimento biológico, como andar, por exemplo, requerem tempo e prática para que se constituam. Costumo dizer que para começar a aprender a ler basta estar vivo!
Levar a criança ao mundo das letras é mais que um ato de educação: é um ato de carinho e cuidado. É na família –com irmãos, avós, primos, tios- mas principalmente com os pais, que a criança desenvolve suas primeiras conquistas; é neste ninho que a criança, afetada pela relação com pai e mãe, vai iniciar seu longo caminho de crescimento. Introduzir a criança na leitura (lembremos, não significa alfabetizá-los precocemente) é um dos grandes presentes que os pais podem ofertar a seus pequenos.
Em 2008, comemoramos pela primeira vez o Dia Estadual da Leitura no Estado de São Paulo e em 2009, também pela primeira vez, o dia Nacional da Leitura. Vamos festejar todos os dias e oferecer a nossos pequenos um presente que não gasta, só fica cada vez melhor e maior e vai ser usado a vida toda: a leitura!!!
Para saber mais:
Dia da Leitura: Oficinas Brincar de Ler. http://www.ecofuturo.org.br/ ; http://www.diadaleitura.org.br/
Nos sites você pode encontrar um bom material sobre leitura, especialmente para os pequenos, incluindo passaportes para a leitura, com dicas ótimas para pais e interessados em geral.
Por que ler para crianças pequenas: Escrevi um texto sobre bons motivos para ler para crianças pequenas, que está disponível também no site da Ecofuturo, em um livro com outros temas bem interessantes. O livro se chama “A vida que a gente quer depende daquilo que a gente faz”.
Sobre letramento, saúde e educação:
BERBERIAN, AP. MORI-DE ANGELIS, C.; MASSI, G. Letramento: Referências em saúde e educação. São Paulo: Plexus, 2006.
CALIL, E. (org.) Trilhas da escrita, Autoria, leitura e ensino. São Paulo: Cortez 2007
* Texto já publicado no site da editora SBS , no ano de 2009.
disponível em http://www.sbs.com.br/virtual/etalk/index.asp?cod=1094
** Lucila Pastorello , fonoaudióloga, doutora em Educação pela USP, recentemente estruturou a Cia. de Leitores Públicos, que reúne pessoas interessadas em leitura em voz alta e transmissão de textos literários.
Fonte: IFono - Fonoaudiologia em Ação
Fonte: IFono - Fonoaudiologia em Ação
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