Para sobreviver, Robinson Padial (Binho), 45, montou um bar em Campo Limpo, na zona sul de São Paulo, mas o seu prazer é a poesia. Da mistura entre a necessidade de sobrevivência e o prazer, criou um ritual de final de ano.
Acompanhado de poetas, músicos e atores, sai pelas estradas parando nas cidades, onde promove saraus em praça pública. Nesta semana, eles vão até Paraty, passando antes por Santos.
Quando não está andando, Binho vai pedalando o que apelidou de "bicicloteca", para emprestar, doar ou receber livros. "A bicicloteca ajuda a interagir com as pessoas. Vamos contando histórias e ouvindo histórias."
A ideia das caminhadas nasceu no bar, onde Binho resolveu fazer, todas as segundas-feiras, um sarau -o concorrido Sarau do Binho. Ali, são emprestados livros, como se fosse uma biblioteca.
Um dos frequentadores daqueles encontros era o então motoboy conhecido como Serginho Poeta. Os dois escreveram o livro "Dois Poetas e um Caminho", no qual, entre outros assuntos, havia referências à América Latina. Veio então a proposta de sair viajando pelo continente. Não deu certo. "Não queria sair viajando de moto", conta Binho.
Andar a pé pela América Latina não parecia viável.
Preferiram ficar dentro do Brasil, parando nas vilas e cidades. A cada ano, juntaram-se mais artistas, quase todos da zona sul e frequentadores do Sarau do Binho. Para Binho, a rua tem uma imagem de liberdade -uma imagem que, segundo ele, veio por causa do livro que mais emocionou sua adolescência.
Ele leu "Capitães da Areia", de Jorge Amado, que fala da vida de rua de Salvador, com seus meninos. "Eu estava entrando em meu borbulho hormonal e fiquei deslumbrando com as descrições que o Jorge Amado era capaz de fazer."
Uma de suas experiências libertárias de rua foi num ano eleitoral.
Com um grupo de amigos, todos poetas, saía pela madrugada munido com cartazes, escadas e um balde de cola. Pregava, então, poesias na cara dos candidatos -esse protesto, iniciado em Pinheiros, espalhou-se pela cidade. "Muita gente ainda fala que se lembra dessa história."
As caminhadas da trupe pelas cidades aliaram, enfim, a visão libertária da rua com a poesia. Como não tem dinheiro para ficar em hotéis, eles acampam, dormem em igrejas ou escolas. "Sempre se dá um jeito, desde que tenha uma praça pública para a gente se encontrar."
Para manter a prática do bar de troca de livros -e era difícil levá-los nas costas-, alguém disse que deveriam colocar os volumes numa bicicleta. E, assim, surgia a invenção da "bicicloteca".
Fonte: Portal Aprendiz
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