Publicado em 05/08/2012 | Yuri Al’Hanati
Indicação de amigos, professores e até mesmo dar um livro de presente são alguns bons caminhos para criar o gosto pela leitura
Claudecir Rocha acredita que apresentar o livro certo a alguém pode formar um leitor
O
cenário atual da literatura no Brasil não é dos mais favoráveis, a
julgar pela última edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil,
levantada pelo Instituto Pró-Livro. O estudo, que foi publicado em março
deste ano e será lançado em formato de livro na Bienal do Livro de São
Paulo estima que apenas metade da população brasileira lê, e os que leem
não consomem mais do que dois livros inteiros por ano, aumentando
décimos de uma média que, historicamente, sempre foi baixa.
Porém,
alguns dados complementares da pesquisa guardam em si pequenas
esperanças de reversão do quadro a longo ou, quem sabe, curto prazo. Por
exemplo, a falta de gosto pela leitura não é um empecilho, já que 62%
dos entrevistados dizem gostar pelo menos um pouco de ler. E embora 87%
dos que não leem afirmem nunca ter ganhado um livro, 88% dos que
ganharam garantem a importância do presente para despertar o interesse
por ler.
Foto: Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo
O estudante Arthur Tertuliano quase sempre ganha livros de presente
O valor de um livro presenteado, portanto, pode ser maior do que se
supõe. É no que acredita o comerciante Cássio Busetto, 36 anos. “Eu
sempre parto do princípio de que se alguém não gosta de ler é porque
nunca foi apresentado aos livros certos. E por livro certo me refiro aos
livros de qualidade e também do interesse da pessoa, que possam trazer
conhecimento ou uma visão de mundo interessante.” Busetto tem o costume
de dar livros de presente para as pessoas quando sabe que há um mínimo
interesse pela literatura, mas é criterioso. “Procuro dar um livro que
combine um pouco o gosto dela com o meu, para não presentear com algo
que eu considero de mau gosto. Quando a pessoa não lê, mas tem algum
interesse, procuro dar algo mais leve e agradável, um entretenimento que
possa levar a leituras mais densas.”
Hillé Puonto, pseudônimo da anônima autora do blog Manual Prático de
Bons Modos em Livrarias, já ajudou muita gente a encontrar esse
presente, e afirma: “o que mais percebo entre as pessoas que vão à
livraria atrás de um livro como forma de presente é a necessidade de se
comunicar com o presenteado. Há muitas que gostam de compartilhar
experiências. Eu, por exemplo, adoro presentear meus amigos com livros
que tenham, de alguma forma, representado algo para mim.”
Quem recebe o presente confirma as opiniões acima. O mestrando em
estudos literários da Universidade Federal do Paraná, Arthur Tertuliano,
25 anos, ganha quase sempre um livro como presente, e diz que o mimo
desperta seu interesse. “Às vezes, fico muito curioso com o que a pessoa
pode estar querendo dizer com ‘este livro é a sua cara’, ou dou
prioridade para lê-lo quando eu sei que ela está ansiosa para comentar
sobre ele”, conta, citando como exemplo o livro Duna, de Frank Hebert,
que ganhou de um amigo. “Estou lendo este não só porque a dedicatória é
excelente, mas porque sei que meu amigo gosta bastante do livro e
gostaria de comentá-lo comigo.”
Indicação valiosa
Esse compartilhamento de experiências no ato de presentear é outro
fator de peso para criar leitores. A pesquisa aponta que o regalo
representa 21% do acesso a livros e a indicação das pessoas é o terceiro
maior fator de influência na hora de escolher um livro para ler,
ficando atrás do título do livro e do tema. “Eu tenho um amigo que
costuma pensar bastante nos presentes e, há três anos, os livros que
ganho dele de aniversário estão entre os melhores que recebo”, comenta
Tertuliano, concordando que uma boa indicação faz toda a diferença:
“você pode dar algo no estilo do que a pessoa gosta, apresentando algo
de que ela ouviu falar, mas com que nunca teve contato direto, ou mesmo
abrindo seus horizontes em algum sentido.”
E a principal indicação acontece na sala de aula: 45% dos entrevistados que leem garantem que foi o professor que os influenciou
ao hábito, mais do que a mãe (43%) e o pai (17%). O professor de ensino
médio e ex-livreiro das Livrarias Curitiba, Claudecir Rocha, 32 anos,
acredita que é só uma questão de fisgar o potencial leitor pelo título
certo. “É preciso indicar algo agradável antes de apresentar o que eles
precisam estudar. Se um aluno de ensino médio tiver de ler só Dom
Casmurro, ele nunca mais vai ler Machado de Assis na vida, mas um conto
do Machado já é mais apetecível”, afirma, e completa contando sua
própria experiência: “li com meus alunos o conto ‘Feliz Ano Novo’, do
Rubem Fonseca, e agora eles adoram o escritor. É só uma questão de
despertar a curiosidade, e a pessoa nunca mais deixa de ler.”
Fonte: Gazeta do Povo
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