segunda-feira, 30 de maio de 2011

A influência das práticas de leitura na formação de leitores

Matéria publicada em Publicada: 25/08/2008

Por mais que se tente explicar por que o brasileiro lê muito pouco, as justificativas não são simples. Conseqüentemente, qualquer ação que possa incentivar crianças, jovens e adultos a ler mais requer uma análise profunda do atual cenário educacional. Mas uma coisa parece estar clara: se não existe motivação para desfrutar o prazer da leitura, então é preciso transformar a relação que as crianças têm com o livro para incentivar a formação de leitores. "A leitura deve ser fonte de conhecimento, mas também é fonte de emoção, de prazer e de lazer", diz Maria Alice Armelin, coordenadora do Entre na Roda do Cenpec e co-autora dos materiais didáticos do projeto, cujo foco é a formação de orientadores de leitura.

Diante desse contexto, um dos desafios é formar, de fato, pessoas que praticam a leitura e não apenas sujeitos que sabem decifrar o código da escrita. Ou seja, essa relação estritamente escolar e obrigatória que boa parte das crianças têm com a leitura precisa ser complementada com a sua prática cultural e social.

Dois atores são fundamentais para despertar nas crianças o prazer pela leitura: a família e a escola. A mãe, como maior influência na formação de leitores, deve cativar os filhos para desenvolver esse gosto. "É mais fácil que uma criança se torne leitora se ela crescer numa casa em que as pessoas manuseiam livros e lêem. Além disso, ao ler ou contar histórias, os pais estreitam vínculos com os filhos", explica Maria Alice. Por outro lado, dos 4,7 livros per capita que o brasileiro lê em um ano, 3,4 são livros didáticos ou indicados pelo colégio, o que indica que a escola pode e deve tirar proveito desse protagonismo para que crianças e jovens desenvolvam uma relação mais rica e diversa com a leitura.

Formação de professores e mediadores de leitura

Cientes de que, ao lado da família, a escola ocupa papel central para a formação de leitores, o MEC e as secretarias estaduais e municipais de educação passaram a formular políticas públicas para combater essa defasagem nos índices de leitura. Em 2000, o MEC criou o Profa, um programa de formação de professores alfabetizadores com foco bastante acentuado nas práticas de leitura.

De modo semelhante, outras iniciativas foram surgindo pelo país, como o projeto Ler e Escrever, da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, que além de estabelecer as orientações didáticas para a prática de leitura, procura aproximar o trabalho dos diretores e coordenadores das escolas. "Uma gestão acaba em quatro anos, por isso é preciso dar autonomia e segurança aos quadros intermediários, às diretorias de ensino e aos supervisores para que eles possam dar continuidade ao trabalho", explica Claudia Aratangy, diretora de Projetos Especiais da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) e uma das coordenadoras do Ler e Escrever.

Segundo Maria Alice, essa aproximação com os gestores é fundamental para conscientizá-los da importância das atividades de leitura em sala de aula. "Muitas vezes, essas atividades são preteridas em função da necessidade de ensinar conteúdos específicos da disciplina, como o plural, o verbo etc. Mas a leitura permite assimilar esses mesmos conteúdos de forma viva e agradável, sem o peso de responder exercícios maçantes", conta.

Além do trabalho com professores e gestores, realizado por meio de parcerias com secretarias de educação e cultura, o Entre na Roda não se limita à escola e é voltado para educadores em geral, com diferentes níveis de formação, incluindo voluntários que realizam rodas de leitura em praças públicas, ONGs, hospitais e até penitenciárias. A idéia é que eles também atuem como mediadores, estimulando a leitura por meio de diferentes gêneros e autores. "Após participar de uma formação do projeto, uma bibliotecária de São Carlos expôs os livros de um determinado autor, fornecendo informações sobre sua vida e obra na biblioteca. Com isso, ela ampliou as retiradas de livros de 338 para 1447 naquele mês", conta Maria Alice.

Cativando os leitores

Para incentivar o debate sobre como os livros devem ser utilizados pelos professores, Claudia Aratangy participou da 20ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, apresentando a palestra "Livros na escola: basta para formar leitores?", que, como ela mesma ressalta, trata-se de uma pergunta retórica: é claro que não é suficiente. "Os livros ficam guardados na escola ou são colocados em salas de leitura pouco freqüentadas, o que dificulta o acesso dos alunos", diz. Ela não só propõe que os professores leiam para os alunos todos os dias, como enfatiza a necessidade de uma mudança nas práticas de leitura. "É preciso compartilhar com os alunos os efeitos que os textos produzem e retratar a beleza de certas expressões ou fragmentos da história. Ao explicitar essas passagens estamos ensinando o que é ser um leitor".

As rodas de leitura propostas pelo Entre na Roda, seja dentro ou fora da escola, seguem o mesmo princípio e procuram estabelecer uma relação que extrapole o simples ato de abrir um livro, com uma conversa anterior e outra posterior à leitura. "A contextualização do que se lê é muito importante para destacar aspectos interessantes do texto e do autor. Criar um clima relacionado à história é uma forma, entre outras, de sensibilizar o leitor para que ele tenha interesse em ouvir ou ler o texto. Depois, o texto dará elementos para a troca de idéias e a reflexão sobre os temas abordados. Isso ajuda a criar um vínculo e uma interação com o grupo", detalha Maria Alice.

A prática social e cotidiana da leitura pode ser estimulada com diferentes textos, adequando a modalidade aos propósitos específicos. "É preciso dialogar com o texto. Pode-se pegar o jornal para comentar as manchetes e as legendas ou estudar por que os textos publicitários utilizam o verbo no imperativo", sugere Claudia. Na opinião de Maria Alice, é necessário ampliar o repertório de leitura e reduzir a influência exclusiva do livro didático, que, muitas vezes traz apenas fragmentos de um texto. "A diversidade é importante para formar o leitor, já que abre diferentes portas de entrada para o mundo da leitura. Os gibis podem ser um bom começo, já que clássicos como Don Quixote são publicados em quadrinhos e podem estimular a criança a ler a obra original no futuro."

Fonte: Cenpec

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