Umuarama – O escritor mineiro, Affonso Romano de Sant'Anna, esteve na última terça-feira (13) em Umuarama para participar da 30ª edição da Semana Literária do Sesc. Em um bate papo com a professora universitária Cacilda Zafaneli, Affonso falou sobre a literatura nos dias de hoje, e em como a tecnologia e a contação de histórias pode ajudar na formação de leitores, fazendo um alerta: “quem não ler e se informar na sociedade do século XXI, principalmente nos próximos anos, será ‘descartado’”.
AGENTES LITERÁRIOS
Frente às dificuldades de se formar novos leitores, e como criador do PROLER (Programa de Promoção da Leitura), que contou com mais de 30 mil voluntários e estabeleceu-se em 300 municípios, Romano defende cada vez mais a importância dos contadores de histórias para despertar a nova geração.
A exemplo disso, o escritor citou um projeto que aconteceu no Ceará. A secretaria de educação treinou algumas pessoas e deu uma bicicleta para cada uma, com cerca de 20 livros para passar por diversas regiões da cidade com o objetivo de incentivar a leitura. “De repente, um sujeito está ali, em uma beira de estrada, sozinho e chega um agente que começa a conversar com ele, por fim, apresentando um livro”, explicou.
O escritor afirmou que esse trabalho modificou o panorama do Ceará e hoje todo o país está copiando esta ideia. Existem atualmente 10 mil programas de leitura no Brasil. “Consegue-se encontrar hoje bibliotecas dentro de borracharias, açougues e isso é fantástico”, comentou.
ESSENCIALIDADE DA LEITURA
Segundo Romano, quem não se informar estará liquidado na sociedade do século XXI, principalmente nas próximas décadas. “Eu já estou tirando o meu time de campo, mas quem for viver o século XXI e não ler e se informar, vai ser lixo jogado para fora da sociedade. O único jeito é ler”, afirmou.
E são esses que não se informam que também se enquadram em um terceiro tipo de analfabetismo, além dos que não sabem ler e escrever e do analfabetismo funcional: o tecnológico. Para isso Romano elogia o uso dos blogs e a quantidade de livros que pode ser baixada gratuitamente na internet. Deste modo, a biblioteca ser muito longe ou o livro ser caro não são desculpas para deixar de ler.
Apesar de a sociedade tecnológica levar o indivíduo para se alimentar apenas da linguagem de imagem, esse cruzamento de gerações que está sendo vivido mostra que “compete a nós apresentar soluções”, refletiu.
LEITURA É TRABALHO
Romano afirmou que leitura não é apenas prazer, como professores e pedagogos adoram pregar nas salas de aula. “Prazer é apenas metade da conversa. Leitura é trabalho, é exercício de uma tecnologia: saber ler e interpretar”, disse.
Uma obra que tem além da qualidade estética e artística um leque de informações muito grande, pode atingir também muito mais gente. Para se ler, por exemplo, Dante Alighieri e o seu Inferno, Purgatório e Paraíso – na obra A Divina Comédia – deve-se ter conhecimento de história, geografia, teologia, filosofia. “Mas uma pessoa simples, sem grandes formações, também pode captar no seu cotidiano algo daquilo tudo”, conta.
LEITURA TEM PODER
Quando escreveu o texto “A Mulher Madura”, Romano se deparou com inúmeras mulheres que o procuravam para contar a importância daquelas palavras em suas vidas. Algumas até faziam centenas de cópias para distribuir. E são várias obras literárias que possuem essa mesma força. “Por causa de um texto pessoas mudam de emprego, de casa, de marido e é por isso que é importante ler. Seja pelo motivo que for, até por egoísmo seria bom que as pessoas lessem”, expõe.
FALTA DE OPORTUNIDADES?
Questionado sobre uma afirmação do escritor Ziraldo que disse “como querer que uma criança leia um livro dentro de um barraco em uma favela do Rio de Janeiro a 40º?”, Romano contou uma história de uma biblioteca que foi colocada dentro de um hospital.
A ideia inusitada aparenta também ser inútil. Mas só aparenta.
“Um dos pacientes não queria aceitar a alta porque não havia terminado um livro que lhe interessava muito. O médico descobriu então, que esse paciente era analfabeto e foi questioná-lo, quando então o enfermo disse: levo este livro pro cara do leito 42 e ‘leio na leitura dele’. Resumindo: quem quer ler, lê nas circunstâncias mais difíceis, não há desculpa”, finalizou Romano.
Ontem foi a vez dos escritores Alice Ruiz e Fabrício Carpinejar falarem sobre “Literatura e Sedução”. Hoje, a Semana Literária contará com o lançamento de uma prata da casa, Simoni Maria Martins com o livro de poesias “Procura-se”. O lançamento acontecerá às 20 horas no salão social do Sesc. A Semana Literária segue até amanhã.
“Estamos em uma sociedade permissiva. Sou contra o autoritarismo, mas hoje a educação concede liberdade demais. Professor tem que ser antes de tudo um sedutor e o aluno deve ser levado a descobrir o seu interesse, o seu assunto preferido, seja ele qual for”
SAIBA MAIS SOBRE AFFONSO
Affonso Romano de Sant'Anna é um caso raro de artista e intelectual que une a palavra à ação. Com uma produção diversificada e consistente, pensa o Brasil e a cultura do seu tempo, e se destaca como teórico, como poeta, como cronista, como professor, como administrador cultural e como jornalista.
Com mais de 40 livros publicados, professor em diversas universidades brasileiras - UFMG, PUC/RJ, URFJ, UFF, no exterior lecionou nas universidades da California (UCLA), Koln (Alemanha), Aix-en-Provence (França). Seu talento foi confirmado pelo estímulo recebido de várias fundações internacionais como a Ford Foundation, Guggenheim, Gulbenkian e o DAAD da Alemanha, que lhe concederam bolsas de estudo e pesquisa em diversos países.
Nascido em Belo Horizonte (1937), desde os anos 60 teve participação ativa nos movimentos que transformaram a poesia brasileira, interagindo com os grupos de vanguarda e construindo sua própria linguagem e trajetória.
Data desta época sua participação nos movimentos políticos e sociais que marcaram o país. Embora jovem, seu nome já aparece nas principais publicações culturais do país. Por isto, como poeta e cronista foi considerado pela revista “Imprensa”, em 1990, como um dos dez jornalistas que mais influenciam a opinião do Brasil.
Nos anos 70, dirigindo o Departamento de Letras e Artes, PUC/RJ, estruturou a pós graduação em literatura brasileira do Brasil, considerada uma das melhores do país. Trouxe ao Brasil conferencistas estrangeiros como Michel Foucault e apesar das dificuldades impostas pela ditadura realizou uma série de encontros nacionais de professores, escritores e críticos literários além de promover a “ Expoesia” - evento que reuniu 600 poetas num balanço da poesia brasileira.
Como jornalista trabalhou nos principais jornais e revistas do país: Jornal do Brasil (pesquisa e copydesk), Senhor(colaborador) ,Veja(critico), Isto É(Cronista), colaborador do jornal O Estado de São Paulo. Foi cronista d da Manchete e do Jornal do Brasil . e está no O Globo desde 1988.
Nos duros tempos da última ditadura militar, Affonso Romano de Sant'Anna publicou corajosos poemas nos principais jornais do país, não nos suplementos literários, mas nas páginas de política . Poemas como “ Que país é este?” (traduzido para o espanhol, inglês, francês e alemão), foram transformados em “posters”, aos milhares, e colocados em escritórios, sindicatos, universidades e bares.
Nessa época produziu uma série de poemas para a televisão (Globo) .Esses poemas eram transmitidos no horário nobre, no noticiário noturno e atingiam uma audiência de 60 milhões de pessoas.
Como presidente da Biblioteca Nacional — a oitava biblioteca do mundo, com oito milhões de volumes — realizou entre 1990 e 1996 a modernização tecnológica da instituição, informatizando-a, ampliando seus edifícios e lançando programas de alcance nacional e internacional.
Criou o Sistema Nacional de Bibliotecas, que reúne 3.000 instituições e o PROLER ( Programa de Promoção da Leitura), que contou com mais de 30 mil voluntários e estabeleceu-se em 300 municípios em 1991 lançou o programa “Uma biblioteca em cada município”.
Fonte: Umuarama Ilustrado
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