Matéria publicada no jornal "O Liberal" em 16 de março de 2010
A Biblioterapia é uma das ferramentas utilizadas no tratamento dos internos do Hospital Universitário Barros Barreto
Alexandra Cavalcanti
Da Redação
Além de proporcionar bons momentos, a leitura também pode ajudar na superação de momentos difíceis. Esse é o ponto de partida para o trabalho desenvolvido pelo Projeto “Biblioterapia”, no Hospital Universidade João de Barros Barreto (HUJBB), em Belém. A técnica é antiga, mas ainda pouco conhecida no país e estimula tanto pacientes internados quanto seus acompanhantes à leitura de livros, revistas e jornais, ajudando-os a lidar melhor com o ambiente hospitalar.
O projeto começou em 2003 partindo do princípio de que uma boa leitura pode amenizar as pressões do dia a dia, inclusive de quem está em tratamento médico. “A dinâmica desse trabalho é aliviar as tensões dos pacientes internados e de seus acompanhantes. Tirar um pouco do foco da doença e levar para a leitura, porque a rotina hospitalar pode causar, entre outras coisas, irritação e até depressão”, explica a coordenadora do projeto e bibliotecária Rosiany Silva.
A primeira parte do projeto consiste em colher informações sobre os assuntos que interessam a esse público alvo. “Visitamos as enfermarias para saber previamente qual tipo de leitura chama atenção dessas pessoas, tanto pacientes quanto acompanhantes”, ressalta a coordenadora. A partir daí, esse material é separado para as ações do projeto.
Nessas pesquisas, para a sur-presa dos envolvidos, algumas curiosidades foram desco-bertas. Uma delas é que leituras relacionadas à agricultura familiar estão entre as preferidas. “Temos muitos pacientes que vêm do interior do estado e esse tipo de leitura faz parte do universo de onde vivem”, explica. Mas também é grande o número de pessoas que se identifica com outros assuntos, como direito tra-balhista, textos didáticos sobre determinadas doenças, além de literatura brasileira e infantil. “Na pediatria especialmente trabalhamos bastante com os contos de fadas e com gibis”, afirma.
Para acompanhar a limitação de alguns pacientes, a coordenadora conta que são u-sadas outras dinâmicas, sempre com a colaboração de voluntários. “O Hospital Barros Barreto é de alta complexidade, por isso, atendemos casos bem específicos, como por exemplo, pessoas que sofrem de diabetes e perderam a visão. Nessas situações, o monitor faz a leitura para esse paciente. O mesmo acontece no caso de analfabetos e pessoas com outras dificuldades para a leitura. Utilizamos também CDs e levamos o rádio até o paciente para que ele possa ouvir histórias”, ressalta Rosiany.
Em Belém, o projeto desenvolvido no Hospital Universitário ganhou ainda um reforço extra. Além da leitura de livros e periódicos, o trabalho utiliza recursos audiovisuais. “Fazemos também sessão de cinema, dinâmicas de grupo e até mesmo sessões de anedotas, que eles gostam bastante”, conta a bibliotecária. O importante, segundo ela, é o uso da linguagem cultural para motivar os pacientes e acompanhantes em ambiente hospitalar.
A biblioterapia não promete milagres e não tem ainda uma comprovação científica sobre seus benefícios, mas ao longo de sete anos, vem colhendo bons resultados. “Temos depoimentos e relatos de experiências muito positivas. Casos, por exemplo, como de pacientes que não interagem com o médico durante o tratamento, seja por timidez ou outro motivo, mas que passam a ter um outro comportamento depois de participar das ações do projeto”, conta.
O retorno também aparece de outras formas. “Alguns pacientes ou acompanhantes participantes do projeto pedem para levar o livro para casa, porque gostaram da leitura e querem levá-la para suas comunidades. Isso é muito bom e nos deixa muito satisfeitos com esse trabalho”, afirma a coordenadora.
Projeto muda a visão do hospital
Para a biblioterapia, a leitura funciona como “alimento da liberdade”, tal como afirmou Fernando Pessoa através de seu heterônimo Álvaro de Campos. Lendo, a pessoa se distancia dos redemoinhos e dos turbilhões das emoções vividas em determinado momento. No ambiente hospitalar, esse efeito não é diferente. Ao invés de sentimentos de ansiedade, agressividade, angústia, tristeza, medo e outras reações devido à doença ou mesmo ao afastamento de casa, o paciente pode entrar num ambiente de bem estar físico, mental e espiritual.
“Esse projeto traz como contribuição uma ideia mais positiva do Hospital como espaço não apenas de sofrimento, mas também de lazer, aprendizado e troca de experiências quando em contato com a leitura e com outras pessoas”, conta a coordenadora do Projeto. A bibliotecária Vera Carvalho, uma das primeiras a trabalhar no projeto dentro do hospital explica que há o envolvimento de equipe multiprofissional, composta por bibliotecário, assistente social, psicólogo, terapeuta ocupacional e bolsistas de biblioteconomia e serviço social. O grupo disponibiliza livros, revistas e jornais de acordo com uma temática definida e o paciente escolhe o tipo de leitura com a qual mais se identifica.
Além dessas leituras, os pacientes também participam de palestras e exibições de filmes sobre educação e saúde, contação de histórias, leitura de mensagens, audição de músicas e textos de autoajuda, peças de teatro, pintura, entre outras atividades, com a finalidade de melhorar o seu estado emocional. “Desde o início, quando ele foi implantado pela Dra Elisa Sá, o projeto sempre foi bem aceito pelos pacientes e seus acompanhantes, porque se tornou uma forma atrativa deles saírem daquela rotina de hospital. Lembro ainda do primeiro filme que exibimos dentro do projeto, foi o „Auto da Compadecida‟. Todos gostaram e riram bastante”, relembra.
O Projeto trabalha com crianças, pacientes adultos e idosos internados no Hospital Universitário João Barros Barreto, dando preferência aos de longa permanência, os que não recebem visitas ou estão desacompanhados. “Percebemos que, além da melhoria do estado físico, o hospital pode contribuir para a elevação da autoestima e até para mudança de comportamento por meio de diferentes formas de ação, como a leitura”, assegura Rosiany da Silva.
No ano passado, o projeto ganhou uma sala própria dentro do hospital, onde são guardados todos os materiais usados, desde livros, revistas, material lúdico, entre outros, tudo fruto de doação.
Serviço
Quem quiser fazer doação de materiais para o projeto pode procurar o setor de Biblioterapia do Hospital Universitário João de Barros Barreto.
Fonte: jornal "O Liberal"
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