Do UOL, em São Paulo
Ler para seu filho que ainda não se alfabetizou
fará com que ele tome gosto pela leitura
fará com que ele tome gosto pela leitura
O livro infantil, antigamente limitado a raras e pouco atraentes
edições, tem ganhado cada vez mais espaço nas grandes livrarias. Os
lançamentos se multiplicam e as publicações tornam-se cada vez mais
sofisticadas. Livro infantil virou até presente de aniversário, coisa
impensada há 30 anos, quando muitas crianças só tinham acesso às
histórias na escola.
Apenas uma coisa não mudou nesses anos todos: a importância da leitura
na formação da criança. De acordo com a pedagoga Clélia Cortez,
orientadora da educação infantil da Escola Vera Cruz, de São Paulo, e
coordenadora do programa Formar em Rede, do Instituto Avisa Lá (ONG de
formação continuada de educadores), independentemente da época, os
livros inserem as crianças pequenas em um mundo de sentidos e de
significados que permite a ampliação e a construção da cultura.
Dicas para formar leitores
- Sempre que possível leia para seus filhos: mesmo crianças pequenas podem participar de situações de leitura;
- Evite comprar o livro pela beleza da edição. Invista na escolha de narrativas que tragam questões que ajudem a lidar com sentimentos e ampliem a relação com a cultura;
- Descubra se a escola do seu filho considera a leitura uma modalidade de ensino e procure colaborar com as práticas de leitura desenvolvidas lá;
- Crie o hábito de levar os filhos, desde pequenos, para passearem em livrarias;
- Leve as crianças a eventos de contação de histórias;
- Não restrinja as escolhas de títulos ao sexo do seu filho. Meninos e meninas podem ler os mesmos livros.
“As boas narrativas podem ajudar as crianças a pensarem muito sobre si
mesmas e sobre os outros. É um ponto de encontro com a expressão
humana”, afirma Clélia. Segundo a pedagoga, os valores surgem nas
relações que as próprias crianças estabelecem entre essas histórias, sua
cultura, casa e escola.
De acordo com a psicóloga Débora Rana, coordenadora pedagógica da
escola socioconstrutivista Projeto Vida, e também formadora do Instituto
Avisa lá, a criança precisa ter o material escrito à disposição, assim
como tem brinquedos, para entrar em contato sempre que desejar.
Os pais devem proporcionar opções de leitura variadas e evitar divisões por gênero. Assim como não existe brinquedo de menino e de menina,
não existe livro para um sexo ou outro. Não ofereça à sua filha apenas
histórias de princesas e a seu filho só as de piratas. “Crianças que só
leem o mesmo tipo de livro acabam ficando sem repertório”, fala Débora. A
variedade de assuntos contribui para o crescimento da rede de relações
da criança e para o entendimento de seu próprio mundo.
Dentre os temas apresentados às crianças na literatura infantil, os
contos maravilhosos –como as histórias dos Irmãos Grimm, na Alemanha, de
Hans Cristian Andersen, na Dinamarca, ou de Garret e Herculano, em
Portugal– sempre foram uma das narrativas mais importantes. Segundo a
professora Cristiane Madanêlo de Oliveira, mestre em literatura
brasileira e especialista em literatura infantil e juvenil pela UFRJ
(Universidade Federal do Rio de Janeiro), essas histórias fantasiosas
exploram situações que ocorrem em locais indeterminados e apresentam
fenômenos que não obedecem às leis naturais que regem o planeta.
Os clássicos originais, além de possuírem riqueza de linguagem, ajudam
as crianças a pensarem sobre questões da existência humana desde muito
cedo.
Um livro para cada criança
Faixa etária | Como deve ser o texto | Ilustrações | Tipos de livro e formas de contar |
De 1 a 2 anos | As histórias devem ser rápidas e curtas | Uma gravura em cada página, mostrando coisas simples e atrativas | Prefira os livros de pano, madeira e de plástico. É recomendado o uso de fantoches |
De 2 a 3 anos | As histórias devem ser rápidas, com textos curtos que se aproximem das vivências da criança | Gravuras grandes e com poucos detalhes | Os fantoches continuam sendo o material mais adequado. Música exerce fascínio e pode ajudar a envolver a criança no enredo |
De 3 a 6 anos | Os livros devem propor vivências do cotidiano familiar. É a fase do “mãe (pai), conta outra vez” | Predomínio absoluto da imagem, com textos brevíssimos | Livros com dobraduras simples. O contador pode usar roupas e objetos característicos. A criança acredita que ele se transforma no personagem |
A partir de 6 ou 7 anos (fase de alfabetização) | Trabalho com figuras de linguagem que explorem o som das palavras. Construções enxutas. Personagens da coletividade, favorecendo a socialização. Inserção de poesia | Ilustração integrada ao texto. Uso de letras ilustradas, de tamanhos e formatos diferentes | O contador e a criança podem recriar passagens da história usando instrumentos musicais, massinha, tintas, lápis de cor, entre outros materiais |
“Os simbolismos ocultos nesse tipo de literatura ajudam a criança a
defender suas vontades e a afirmar sua independência em relação ao poder
dos pais ou à rivalidade com os irmãos ou amigos”, explica Cristiane. É
nesse sentido que a literatura infantil e, principalmente, os contos de
fadas podem ser decisivos para a formação da criança em relação a si
mesma e ao mundo à sua volta.
Segundo a professora, a própria psicanálise se apropriou dos contos maravilhosos e seus significados simbólicos para explicar e resolver os eternos dilemas que o homem enfrenta ao longo de seu amadurecimento emocional.
Segundo a professora, a própria psicanálise se apropriou dos contos maravilhosos e seus significados simbólicos para explicar e resolver os eternos dilemas que o homem enfrenta ao longo de seu amadurecimento emocional.
De um modo geral, essas histórias apresentam personagens bons ou maus,
belos ou feios, poderosos ou fracos, de maneira maniqueísta, o que
facilita para a criança a compreensão de certos valores básicos da
conduta humana. “Os contos de fadas trazem categorias de valor que são
perenes e, segundo a psicanálise, a criança é levada a se identificar
com o herói não devido à sua bondade ou à sua beleza, mas por sentir
nele seu inconsciente desejo de bondade e beleza e, principalmente, sua
necessidade de segurança e de proteção.”
No entanto, como as histórias fantasiosas são ricas em possibilidades,
mas, ao mesmo tempo duais, é muito comum que sejam usadas por pais e
educadores como pretexto para moralizar as crianças. “Muitos adultos
simplesmente concluem pelas crianças e não permitem a elaboração do
entendimento individual do texto, que é diferente para cada ser humano”,
diz Débora.
A intenção de ensinar as crianças a se comportarem pela literatura é
uma distorção do significado da formação de valores. Um exemplo disso
são as provas de literatura aplicadas há algum tempo nos colégios, onde o
mais importante era a criança responder de acordo com a interpretação
pessoal do professor sobre o livro e não com a sua própria. “Esse é o
uso equivocado da leitura. Isso amedronta e ensina as crianças a odiarem
a leitura, porque não podem participar efetivamente dela”, diz Débora.
Ambas as educadoras do Instituto Avisá Lá reforçam que o compromisso da
escola deve ser o de dar sentido à experiência leitora e não padronizar
comportamentos ou destruir textos, que, em sua maioria, foram escritos
para ajudar as crianças a construírem por si mesmas seus pensamentos e
valores. “A escola é a grande responsável pela formação do leitor,
para tanto deve ter clareza desse propósito em seu projeto educativo”,
afirma Clélia.
Contar a história
A maioria das pessoas acredita que ler é uma ação para quem sabe ou
consegue. Esse pensamento exclui dessa importante atividade todas as
crianças abaixo de 6 anos, os analfabetos e as pessoas com deficiência
visual.
“Ter contato com o texto escrito, via o próprio olhar, ou o olhar do
outro, é ler”, fala Débora. Com base nesse conceito ampliado, a
psicóloga ensina que a primeira inserção das pessoas no mundo da cultura
é pela leitura, porta que deve ser aberta desde o momento que o bebê
nasce. “Quando os pais ou cuidadores leem histórias para as crianças,
eles estão fazendo com que elas leiam.”
Por fim, é importante também que o adulto demonstre prazer ao ler,
porque o hábito da leitura é transmitido pelo exemplo. Adultos que leem
continuamente na frente das crianças, com certeza, serão imitados no
futuro. “O modelo de leitor é passado, é mais provável que, em uma
família de leitores, a criança também se torne leitora”, afirma Débora.
Papel da escola
Quem quer que tenha o hábito de leitura já percebeu que o modo de ler
um livro é diferente da maneira como se lê um jornal. “São
comportamentos leitores distintos”, explica Débora. Enquanto a família
dá o exemplo da leitura, a escola deve ensinar a criança a desenvolver
os diferentes comportamentos leitores.
“Quando a escola toma para si que a leitura é uma das modalidades de
ensino, as crianças podem aprender diferentes repertórios estruturantes
de leitura”, fala. Para a coordenadora pedagógica, os principais erros
das escolas com relação ao assunto é tratar a leitura como tapa-buraco
da grade escolar e não considerá-la um valor. “Essa posição pode ser
identificada em escolas que não têm um bom acervo de livros ou nem se
preocupam em atualizá-lo.”
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