Que ler para as crianças têm um efeito positivo é um dado adquirido. Mas um novo estudo analisou a fundo a complexa - e em alguns pontos surpreendente - relação entre o crescer a ouvir ler livros e o desenvolvimento linguístico
19 de Agosto de 2015
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Este mês, a publicação científica Pediatrics inclui um
estudo que, através de ressonância magnética funcional, observou a
atividade cerebral de crianças entre os 3 e os 5 anos enquanto ouviam
histórias apropriadas à sua idade. Os investigadores encontraram
diferenças significativas entre as crianças às quais eram lidas
histórias à noite e as outras.
As crianças cujos os pais reportaram ler mais em casa, com maior
frequência e maior número de livros, mostraram uma ativação bastante
maior de áreas cerebrais numa região do hemisfério esquerdo ligada à
integração multissensorial, conforme explica o principal autor do
estudo, John S. Hutton, investigador clinico no Cincinnati Children's
Hospital Medical Center. Esta zona do cérebro, que é conhecida por
estar extremamente ativa quando crianças mais velhas leem livros por si
próprias, revelou o mesmo efeito quando crianças mais novas ouvem
histórias.
Uma das descobertas mais surpreendentes do estudo foi a de que as
crianças mais expostas a livros e à leitura em casa mostram uma
diferença significativa de atividade em áreas do cérebro que processam
associação visual, mesmo que a crianças estejam apenas a ouvir ou não
haja imagens nos livros.
"Quando as crianças estão a ouvir histórias, estão a imaginar na sua
mente", explica Hutton. "Por exemplo, 'o sapo saltou por cima do
tronco'. Eu já vi um sapo, eu já vi um tronco, como é que isto
será?" Os diferentes níveis de ativação cerebral, disse, sugerem que
uma criança que tem mais prática a desenvolver estas imagens visuais
terá uma maior probabilidade de desenvolver habilidades que a ajudarão a
produzir imagens e textos próprios mais tarde.
"Ajuda-os a perceber qual o aspeto das coisas e poderá ajudar na
transição para livros sem imagens," disse. "Irá ajudá-los a ser melhores
leitores mais tarde porque desenvolveram essa parte do cérebro que os
ajuda a perceber o que se passa na história."
O investigador acredita que o livro poderá ajudar também a estimular a
criatividade de uma forma que a televisão não consegue. "Quando lhes
mostramos um vídeo de uma história, será que estamos a cortar um pouco o
processo?" pergunta. "Estamos a tirar-lhes o trabalho? Eles não têm de
imaginar a história; está apenas a ser-lhes dada."
O estudo concluiu ainda que a linguagem dos livros, quando comparada
com a linguagem usada pelos pais ao falar com os filhos, é mais
completa, expondo, por isso, as crianças a um vocabulário mais alargado.
Sabe-se o quanto a sensibilização para os livros na infância é
importante na formação de adultos leitores. Livros ilustrados,
ficcionais, não ficcionais... As possibilidades são múltiplas. A dica é
explorar títulos diversos e estabelecer quanto antes uma relação afetiva
entre a criança e o livro. A coordenadora pedagógica da Comunidade
Educativa Cedac e do Laboratório de Educação Sandra M. Murakami Medrano e
a formadora de professores na ¿Comunidade Paraisópolis Cristiane
Tavares analisam o assunto.
Livro ilustrado não ficcional uma outra experiência leitora
por Sandra M. Murakami Medrano
Ao pensarmos em livros para crianças, normalmente nos vêm à lembrança
livros ficcionais, ou os chamados literários. Porém, ao nos determos um
pouco mais sobre os livros disponíveis, verificamos que não somente os
ficcionais encontram-se no rol de ótimos livros para encantar os
pequenos e possibilitar a eles a entrada na leitura. Que outros livros
são esses? Por ora os denominaremos não ficcionais, para distingui-los
dos primeiros. O que nos interessa, aqui, é propor uma reflexão sobre
que livros não ficcionais seriam boas portas de entrada para leitura das
crianças e quais contribuições esses livros podem trazer para a
formação dos leitores iniciantes.
Apesar dessa distinção entre ficcionais e não ficcionais, é preciso
considerar que a fronteira entre esses dois modos de conceber os livros é
bastante fluida e movediça. Para saber de que livros estamos falando,
vamos nos valer da ideia de continuum para compreender que estes podem
se posicionar ao longo de um eixo em que, de um lado identificamos os
livros informativos que organizam seu conteúdo como verbetes
enciclopédicos, como, por exemplo, o livro Procura-se! Galeria de
animais ameaçados de extinção (Vários autores/Mario Bag, Companhia das
Letrinhas/Ciência Hoje das Crianças, 2007), em que os dados científicos
são apresentados de maneira criteriosa ao longo do texto, acompanhado de
imagens que identificam visualmente o animal. Do lado oposto desse eixo
contínuo, poderíamos encontrar o livro Princesas esquecidas ou
desconhecidas (Salamandra, 2008), de Philippe Lechermeier e Rébecca
Dautremer, que parte de um conteúdo ficcional, mas o apresenta
utilizando o formato enciclopédico, com definições, exemplos, esquemas,
índice temático e alfabético, típico das enciclopédias mais renomadas.
Ao longo desse eixo poderiam estar diferentes livros que, ora mais
estritamente informativos, ora misturando aspectos ficcionais, mas se
valendo das características desses outros, formam um livro distinto das
ficções propriamente ditas, mesclando-se com elas, no entanto, em um dos
extremos. Podemos também pensar em outro continuum que parte de um
extremo definido pelos livros informativos sem enredo narrativo, como,
por exemplo, os livros como A joaninha (Melhoramentos, 1991), da coleção
Minhas primeiras descobertas, em que os dados sobre como é o inseto,
sua constituição, alimentação etc. são apresentados por meio de imagens
que se compõem a partir da sobreposição de páginas (uma opaca e outra
transparente) e informações científicas ao longo do livro.
No outro extremo desse contínuo poderíamos encontrar os livros de
Babette Cole, como Mamãe nunca me contou (Ática, 2003), livro que – como
indica Ana Garralón – “combina ¿um texto mais ou menos ficcional, isto
é, pessoal, com uma estrutura interna ordenada e uma informação que,
apesar do tom às vezes informal, não abre mão do rigor”. Nesse segundo
continuum – que vai do livro informativo sem enredo narrativo ao
informativo com enredo narrativo –, poderíamos localizar na sequência
vários outros títulos partindo de um ponto a outro, como o livro
Adivinhem onde vivem (Brinque Book, 2012), de Liesbet Slegers; Lá em
casa somos (Cosac Naify, 2012), de Isabel Minhós Martins e Madalena
Matoso; Minha casa azul (SM, 2009), de Alain Serres e Edmeé Cannard; Eu
cresci aqui (Pequena Zahar, 2012), de Anne Crausaz; os livros de Peter
Sís: O muro (Companhia das Letrinhas, 2012), O mensageiro das estrelas
(Ática, 1999), A árvore da vida (Ática, 2004); alguns livros que contam
a vida de personagens conhecidos: Frida (Cosac Naify, 2004), de Jonah
Winter e Ana Juan; O menino que mordeu Picasso (Cosac Naify, 2011), de
Antony Penrose; Jemmy Button (Pequena Zahar, 2012), de Jennifer Uman
Valério Vidali e Alix Barzelay; Lineia no Jardim de Monet (Salamandra,
1992), de Christina Bjõrk e Lena Anderson; Diferente como Channel (Cosac
Naify, 2009), de Elizabeth Matthews; Um Outro País para Azzi (Pulo do
Gato, 2012), de Sarah Garland; É um livro (Companhia das Letrinhas,
2009), de Lane Smith; e Para que Serve um Livro? (Pulo do Gato, 2011),
de Chloé Legeay.
Essa pequena seleção não esgota os títulos que poderiam compor esse
contínuo, mas tem a intenção de colaborar na compreensão da ideia de um
universo de livros que são concebidos com uma diversidade de aspectos
que se movem de uma ponta a outra dependendo das características aqui
destacadas. Isso nos mostra que, tanto no que se refere ao extremo de um
livro com texto ficcional e formato enciclopédico como a um livro que
parte de uma narrativa com toque ficcional, mas com conteúdo científico
ou histórico, essa divisão entre ficção e não ficção é bastante tênue. A
análise dos continuuns permite, ainda, visualizar um conjunto de livros
com algumas qualidades distintivas ao longo de sua distribuição. Mas
qual a contribuição desses livros não ficcionais para a formação de
leitores e que experiência de leitura possibilitam?
Louise M. Rosenblatt, em La Literatura como Exploración (Fondo de
Cultura Económica, 2002), traz o conceito transacional da leitura, em
que propõe a superação da visão dualista de pensar o texto e o leitor na
qual ou o leitor atua sobre o texto (leitor interpreta o texto) ou o
texto atua sobre o leitor (leitor responde ao texto), para uma leitura
transacional, em que “o leitor infunde significados intelectuais e
emocionais à configuração de símbolos verbais e esses símbolos canalizam
pensamentos e sentimentos”.
Com essa forma de compreender a leitura, podemos considerar que o
sentido não está só no texto ou só no leitor, mas na relação entre
ambos, numa contribuição contínua para a construção de significados.
Assim, não é o texto em si que define como pode ser lido, mas é na
relação entre as intenções e conhecimentos do leitor e o conteúdo do
texto que se dá a leitura, a transação.
Essa leitura pode, segundo Rosenblatt, ser mais estética ou mais
eferente. Abordando sinteticamente aqui, a postura estética na leitura
estaria mais relacionada aos aspectos afetivos e a postura eferente,
centrada principalmente em selecionar e abstrair analiticamente as
informações. Pensando na formação de leitores, essas colocações nos
remetem à necessidade de proporcionar às crianças, desde muito cedo,
condições para que possam desenvolver a capacidade de adotar ambas as
posturas para serem leitores autônomos e críticos ao lidarem com a
diversidade de leituras que enfrentarão vida afora.
Uma das maneiras de possibilitar às crianças espaço para essa
experiência leitora é oferecendo livros que, segundo Ana Garralón, “são
excelentes para criar pontes entre essas duas formas de ler, estética e
eferente, auxiliando os leitores a indagar o que significa uma leitura
prática enquanto lhes oferecemos textos que lhes brindam leituras
estéticas sugestivas”. Exemplos desse tipo de livro são alguns dentre os
chamados livros álbum (livro ilustrado/álbum ilustrado/picturebook –
denominação em construção no Brasil), como os já citados livros de Peter
Sís ou o também citado Minha Casa Azul. Esses livros trazem informações
históricas ou científicas, por meio da amálgama texto-imagem-suporte,
típico do livro álbum, que possibilita ao leitor ora assumir uma postura
mais eferente ao analisar as informações, ora mais estética ao se
envolver com as imagens, as ideias e os sentimentos proporcionados pelo
livro.
A formação do leitor pode, dessa forma, se dar também por meio de um
livro não ficcional, a partir de uma experiência leitora distinta, uma
leitura que abre para novas questões, instiga novos conhecimentos,
desafia intelectualmente o leitor, de forma a colocá-lo numa posição
ativa de construção de conhecimentos. Garralón, Ana. “Ficção e
informação: tendências nos livros informativos”. Revista Emília:
revistaemilia.com.br/mostra.php?id=126
“o amálgama texto-imagem-suporte, típico do livro álbum,
(...) possibilita ao leitor ora assumir uma postura mais eferente ao
analisar as informações, ora mais estética”
Sandra M. Murakami Medrano é pedagoga e mestre em didática pela
Universidade de São Paulo (USP), coordenadora pedagógica da Comunidade
Educativa Cedac e do Laboratório de Educação e colaboradora da revista
Emília
Livro ilustrado: um “concerto polifônico” para o deleite do leitor
por Cristiane Tavares
A expressão “concerto polifônico” foi usada pelo autor e ilustrador
Renato Moriconi para definir o livro ilustrado. Moriconi, em parceria
com o escritor Ilan Brenman, recebeu os prêmios “melhor livro-imagem” em
2011, com Telefone sem Fio, Companhia das Letrinhas, e “melhor livro
para a criança” em 2012, com O Alvo, Editora Ática, pela FNLIJ (Fundação
Nacional do Livro Infantil e Juvenil). Segundo ele, “há no livro
ilustrado três línguas diferentes – a palavra, a imagem e o projeto
gráfico ou arquitetura do livro – que, se bem usados, fazem dele um belo
concerto polifônico, com sons e silêncios próprios”. Exemplo disso pode
ser observado no próprio livro O Alvo, selecionado para integrar o
Catálogo White Reavens 2012 de uma das mais importantes bibliotecas
especializadas em literatura infantil e juvenil do mundo, a
Jugendbibliothek de Munique, na Alemanha.
Em O Alvo, de imediato o leitor se depara com uma flecha que atravessa a
capa vazada e o convida a seguir o tracejado livro adentro. O suporte é
criativamente atingido como alvo que se expande também nas guardas, ao
abrirmos o livro. Enquanto o texto verbal apresenta uma narrativa de
origem judaica recontada sem grandes alterações, com a linearidade
clássica do enredo comum às narrativas de tradição oral, a ilustração
brinca com a busca certeira por um alvo, apresentando-o a cada página em
um lugar diferente e abrindo para a plurissignificação: variedade de
pontos de vista, importância da perspectiva, flexibilidade necessária
para encontrar respostas a perguntas essenciais, dentre outras.
Partindo da metáfora do concerto proposta por Moriconi, podemos
entender como atributo principal do livro ilustrado a integração de
diferentes vozes que compõem um todo indissociável, produtor de sentido.
Diferente do que ocorre nos chamados livros com ilustração, nos livros
ilustrados (picturebook) também conhecidos como livros-álbum, a imagem
não é mero complemento do texto, o suporte não é simples receptáculo e o
projeto gráfico tem forma e conteúdo. Todos esses aspectos conversam
simultaneamente com o leitor, convocando para uma “desautomatização do
olhar” (Chklovski, 1976). Ler, reler, ver e voltar a ver são movimentos
comuns diante de um livro ilustrado: “O livro álbum possibilita uma
atenção ao objeto livro em sua plenitude – os formatos, as cores, as
informações omitidas e complementares no texto e na ilustração. Ao ler
Quero meu chapéu de volta, de Jon Klassen, WMF Martins Fontes, para
crianças pequenas, por exemplo, já é rotineiro o voltar das páginas para
o início para melhor compreender a trama”, relata Magno Rodrigues
Faria, pedagogo, educador de biblioteca e contador de histórias no
Instituto Acaia, em São Paulo.
Tanto o estranhamento provocado pelo desafio de deslocar o olhar linear
rotineiro diante do objeto livro como as constantes releituras que
muitas vezes esse tipo de livro requer acionam uma atividade leitora
pautada na interação não apenas entre o leitor e as diferentes
linguagens, mas também entre os leitores. Depois de ler um bom livro
ilustrado, é preciso falar sobre o que foi lido, visto, percebido,
provocado. Comentar a leitura para melhor se apropriar dela. A
polifonia, portanto, caracteriza tanto a composição do livro ilustrado
como as experiências leitoras que proporciona: o sentido se constrói,
interna e externamente ao objeto, mediante essa multiplicidade de vozes
que o circundam.
Como leitora, apreciadora e “colecionadora” de livros infantis, é assim
que Ana Claudia Rocha, diretora do Centro de Estudos e Projetos em
Educação Movimenta, define sua relação com o livro ilustrado: “É muito
comum encontrar-me com o encantamento das pessoas diante desses livros
múltiplos, observando como o jogo entre palavra e imagem ganha a cena da
comunicação mais fluida e ágil, compartilhada em outro canal, que não o
da densidade singular da leitura solitária. O contato com esses livros
quando estamos em situação coletiva provoca um verdadeiro “frisson”,
tamanha a reverberação!”.
Se falar sobre o livro ilustrado após sua leitura é quase uma condição
para a construção do sentido, outra característica emerge do contato do
leitor com o objeto: sua natureza dialógica. Como já vimos, as
linguagens verbal e visual estão em necessário diálogo com o suporte. Do
mesmo modo, as relações que o leitor estabelece durante a leitura se
amplificam e ressignificam à medida que uma conversa sobre o livro
acontece. O aspecto dialógico se estabelece, sobretudo, no espaço entre o
dito e o não dito, de onde brota a arte: “Vejo o livro-álbum como um
objeto artístico a partir do qual se constroem vários significados, se
realizam conexões, relações intertextuais e se estabelecem certas
rupturas com as técnicas narrativas habituais. Nesse tipo de livro as
ilustrações sugerem mais do que dizem, insinuam mais do que revelam e
reinam a sutileza, a ironia...”. É assim que Fernanda Glaessel Ramalho,
pedagoga que trabalha com formação de professores, define o livro
ilustrado.
Na escola, à leitura compartilhada de um livro ilustrado, mediada pelo
professor, quase sempre se segue uma conversa apreciativa durante a qual
a escuta da percepção do outro repercute na experiência leitora de cada
um. Até mesmo a leitura de uma nova versão para um dos mais conhecidos
contos de fadas pode suscitar leituras surpreendentes, quando
apresentada sob a forma de livro ilustrado. É o caso de Uma Chapeuzinho
Vermelho, de Marjolaine Leray, publicado em 2012 pela Companhia das
Letrinhas. No livro, os papéis do lobo mau e da Chapeuzinho
subvertem-se. A ilustração funciona como contraponto irônico ao
apresentar, em traços simples, a lápis, nas cores preto e vermelho, uma
Chapeuzinho frágil e ainda menor que o diminutivo que já a acompanha,
contracenando com um lobo faminto e viril. Fragilidade por trás da qual
se esconde a astúcia feminina responsável pela surpresa revelada ao
leitor apenas nas últimas páginas.
Como objetos artísticos, os livros ilustrados podem converter-se,
ainda, em “campo de experimentação para autores e leitores”. É o que
pensa a premiada autora e ilustradora mineira Angela Lago: “... somamos o
texto e a imagem ao próprio suporte que é o livro. Podemos usar o
ângulo da página na construção dos desenhos, ou a passagem das folhas
como um corte em que se impõe a narrativa. De alguma maneira, autores e
leitores do livro-álbum nos qualificamos para ler também os suportes com
as suas particularidades. Entender o livro como mídia nos faz
aprofundar a compreensão dos diferentes diálogos possíveis entre as
várias linguagens”.
Exemplos como os citados por Angela Lago estão na própria origem do
livro ilustrado contemporâneo. Autores, ilustradores e editores
audaciosos romperam com estereótipos predominantes sobretudo nos livros
destinados ao público infantil e apostaram no deleite estético de um
leitor sem idades. Caso do clássico Onde vivem os monstros, de Maurice
Sendak, publicado originalmente em 1963 e editado no Brasil em 2009,
pela CosacNaify, mesmo ano em que foi adaptado para o cinema por Spike
Jonze. Ao trazer para as páginas de um livro o universo do inconsciente
infantil em toda a sua complexidade, condensando-o em uma breve e
intensa aventura narrada verbal e visualmente, Sendak mostrou que é
vasto e ilimitado o campo da experimentação artística.
“As relações que o leitor estabelece durante a leitura se
amplificam e ressignificam à medida que uma conversa sobre o livro
acontece”
Cristiane Tavares é mestre em Literatura e Crítica Literária pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), trabalha com
formação de professores na Comunidade Paraisópolis e colabora para a
revista Emília
Projetos de incentivo ao contato com o universo dos livros
permitem o acesso de um público variado, incluindo estudantes,
viajantes, trabalhadores e comunidades carentes, ao acervo de
bibliotecas
O incentivo ao hábito de leitura é uma ação consolidada no cotidiano do
Sesc. As unidades Araraquara, Belenzinho, Bertioga, Bom Retiro,
Campinas, Carmo, Pompeia, Ribeirão Preto, Rio Preto, São Carlos, Santo
Amaro, Santo André e Sorocaba possuem bibliotecas e as demais geralmente
contam com salas de leitura ou espaços alternativos onde são
disponibilizados periódicos e livros para consulta.
Para realizar o empréstimo, é necessário que a pessoa interessada faça
um cadastro, apresentando documento de identidade (ou cartão de
matrícula) e comprovante de residência atualizado. As bibliotecas ainda
“promovem atividades voltadas à mediação de leitura, contação de
histórias, encontros com escritores, oficinas e workshops, intervenções e
atividades que envolvem outras mídias e suportes, sempre com o objetivo
de mediar o acervo, aproximando livros e leitores”, explica a técnica
de Literatura e Bibliotecas da Gerência de Ação Cultural do Sesc São
Paulo, Ana Luisa Sirota.
O acervo diversificado permite ao leitor ter acesso a obras nacionais,
estrangeiras, clássicas e contemporâneas, que abarcam os gêneros
romance, poesia, crônicas, contos, novelas e quadrinhos, além de
periódicos, tendo por objetivo atender a todas as faixas etárias. Tendo
isso em vista, Sirota explica que busca equilibrar a oferta das unidades
com expectativas e indicações do público. “A partir de 2014, algumas
unidades estudam a inserção de e-readers e tablets para acesso a
e-livros e outros conteúdos nos espaços das bibliotecas”, afirma.
BiblioSesc
Buscando oferecer o acesso à literatura além das fronteiras de suas
unidades, o Sesc criou bibliotecas móveis, como é o caso do projeto
BiblioSesc. A iniciativa do Departamento Nacional do Sesc, criada em
2001, em parceria com os departamentos regionais da instituição,
“destina-se a promover a leitura através da ampliação e facilitação das
condições de acesso ao livro nas localidades periféricas onde o Sesc
atua, encurtando a distância entre o leitor e o livro, principalmente
para o segmento da população carente de acesso aos bens culturais”,
explica a técnica responsável pela coordenação nacional do Projeto
BiblioSesc, da Gerência de Cultura do Departamento Nacional do Sesc,
Lisyane Wanderley.
Para a realização desse trabalho, cada biblioteca volante conta com um
bibliotecário, um auxiliar de biblioteca e um motorista, que atuam como
mediadores do acervo. Os bairros atendidos são selecionados conforme a
carência de bibliotecas ou de outros equipamentos culturais e recebem
visitas quinzenais, sempre no mesmo dia da semana. O intervalo entre as
visitas corresponde ao prazo do empréstimo dos livros que, para ser
realizado, necessita da apresentação do documento de identidade e um
comprovante de residência.
O projeto, que tem atendimento gratuito, é direcionado ao público
jovem, e suas 54 unidades volantes já atingiram Pernambuco, Acre,
Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, entre
outros estados, totalizando 250 localidades em todo o Brasil. “São três
mil publicações ¿diferentes, cuidadosamente escolhidas e atualizadas em:
literatura brasileira e estrangeira traduzida, de ficção e não ficção,
para crianças, jovens e adultos; livros de complementação escolar e de
interesse geral; jornais, revistas e gibis”, esclarece Lisyane. Segundo
ela, o índice de extravio é menor do que 1% do total de empréstimos.
Mala do autor
Outra iniciativa de apoio à leitura organizada pela instituição é o
Mala do Autor, projeto iniciado em 2013 que faz ponte entre bibliotecas e
escolas localizadas principalmente no entorno do Sesc Interlagos. A
programação propõe “rechear” uma mala com obras de um autor escolhido
para a atividade, além de livros de escritores consagrados que o
influenciaram, somando 30 volumes. “Além do incentivo à leitura, o
projeto visa divulgar as atividades da biblioteca móvel da unidade
Interlagos e possibilitar o acesso de forma mais ampla para os escolares
e seus familiares”, explica o bibliotecário do Sesc Interlagos João
Doescher.
Desde o início do projeto, as malas montadas por dois autores (Marcelo
Maluf e Ferréz – nome artístico de Reginaldo Ferreira da Silva) já foram
entregues em oito escolas – entre elas, a Presidente João Goulart, a
Ibrahim Nobre e a Professor Vicente Rao, que receberam a mala do
escritor Marcelo Maluf, em março de 2013 –, junto com um manual de
possibilidades de utilização para nortear os professores. Após o uso do
material por um período médio de um mês, é organizado um encontro com o
autor selecionado. Para setembro deste ano, já é cotada a participação
da dupla literária Lalau e Laura Beatriz (escritor e ilustradora).
Apesar das sugestões do Sesc, cada escola tem a opção de explorar as
obras da maneira que lhe convém. “A proposta é que seja uma utilização
livre de obrigações. Assim, o projeto pode ser incorporado às
necessidades da escola”, esclarece Doescher.
Baú de Letras
Com o objetivo de aproximar e ampliar o universo literário dos
trabalhadores do comércio surgiu o projeto Baú de Letras, que começou há
mais de cinco anos. Acervos móveis compostos por 80 a 100 livros ficam à
disposição dos profissionais interessados por romances, contos,
crônicas, poesias, biografias, entre outros gêneros, e em alguns casos,
títulos infanto-juvenis, destinados às famílias dos funcionários,
contemplando escritores brasileiros e estrangeiros, clássicos e
contemporâneos.
“A ideia surgiu da possibilidade da extensão deste atendimento às
empresas do comércio da região devido à proximidade física destes
locais, e pelo foco no atendimento a comerciários, premissa da missão do
Sesc”, conta a bibliotecária do Sesc Carmo Luciana Florindo. A
interação literária com os estabelecimentos comerciais se dá nas
unidades Bom Retiro, Carmo, Bauru, Araraquara, Catanduva e Ribeirão
Preto.
Meus Livros de Viagens
O Sesc mostra que é possível viajar por meio da leitura com o projeto
iniciado em 2008 no Sesc Consolação, chamado Meus Livros de Viagens. Por
meio da oferta de pequenos acervos depositados em quatro “malas
viajantes” nos transportes com destino aos roteiros preparados pelo
Programa de Turismo Social, os viajantes são convidados a acessar
conteúdos em formato de livros que podem estar relacionados ao lugar de
destino – como guias de viagens, obras literárias e outras publicações
que abordam os aspectos culturais, a gastronomia, os patrimônios
históricos e as personalidades dos locais visitados –, variando de
tamanho conforme a duração da viagem.
Ao longo do trajeto, o guia de turismo tem a missão de incentivar o
conhecimento do projeto. Os volumes “também abordam as peculiaridades
das regiões a serem visitadas e seus ecossistemas, como a região
pantaneira, as obras de Machado de Assis inspiradas na cidade do Rio de
Janeiro e as poesias de Mario Quintana baseadas no ato de viajar. Mas as
obras literárias e publicações diversas podem ou não estar ligadas aos
destinos visitados, com o objetivo de simplesmente enriquecer a
experiência da viagem”, afirma a técnica da área de Turismo Social do
Sesc Consolação Ana Cristina de Souza. Ela ainda esclarece que os
viajantes têm uma ótima adesão ao projeto e, no momento do embarque, a
mala é logo reconhecida e desperta o interesse pela leitura.
As Histórias em Quadrinhos, conhecidas como HQ’s, são narrativas feitas
com desenhos sequenciais, normalmente acompanhados por textos curtos de
diálogos e algumas descrições da situação. O quadrinista Will Eisner,
um grande nome dessa arte, define a linguagem dos HQs como “arranjo de
fotos ou imagens e palavras para narrar uma história”. Difundido em
revistas e jornais, as HQs criaram linguagem própria, signos e símbolos
inovadores, que foram incorporadas posteriormente a outras artes.
Existem diferentes formas de Historias em Quadrinhos dentre elas os
tradicionais gibis ou comic book, formato mais tradicional usado para
publicações de histórias, de series noir, e os populares super-heróis,
por exemplo, a Turma da Monica e X-men.
Outro exemplo são os graphic novels, livros em quadrinhos com enredos
mais longos e complexos. Também costumam ser chamado assim HQ’s com
qualidades artísticas e acabamentos diferenciados, superiores aos demais
HQ’s.
Outra forma de Histórias em Quadrinhos que vem tomando o gosto do
leitor brasileiro é o Mangá, estilo Japonês de HQ, cuja leitura é feita
no sentido da leitura do idioma japonês, ou seja, da direita para a
esquerda, ao contrario do nosso sentido convencional. Um dos traços mais
marcantes do mangá são os olhos grandes e expressivos das personagens.
Alguns exemplos marcantes desse gênero são Dragon Ball , Naruto e One Piece .
Pela forma característica do HQ de dramatizar narrativas, clássicos da
literatura tem sido há algum tempo adaptados para essa linguagem, como
forma de sensibilização para essas narrativas tradicionais. À algumas
adaptações que já compunham o nosso acervo, como O Alienista de Machado
de Assis, Dom Quixote de Miguel de Cervantes e O Corvo de Edgar Allan
Poe, somam-se novos títulos como Alice no Pais das Maravilhas e O Hobbit em HQ, além de Hamlet e O Grande Gatsby em mangá!
Além de uma arte em si, as histórias em quadrinhos podem ser uma forma
de estimular a leitura literária, pelo fato desta forma de literatura
muitas vezes desenvolver as narrativas mais tradicionais de forma mais
fluida e dinâmica, principalmente no que se refere ao público mais
jovem.
A experiência de ler um quadrinho também é uma oportunidade de
perpetuar o gosto pelo livro como objeto, e não só como leitura de um
texto, e, ao misturar mais de uma linguagem ao mesmo tempo, possibilita
ao leitor atribuir significados e aprender a relacionar textos e
linguagens diferentes, tornando-se um leitor mais completo.
Além de provocar um momento de leitura mais leve, as historias em
quadrinhos ajudam a estimular a criatividade e a desenvolver o
vocabulário do leitor. Por estes e outro motivos as HQ’s podem servir de
entrada para o mundo da literatura.
Visite o caminhão do BiblioSesc que fica estacionado todos os finais de semana e feriados aqui no Sesc Osasco das 10h45 às 18h.